terça-feira, 15 de julho de 2008
Há quem faça desta necessidade diária do nosso organismo um prazer. E talvez todo o assunto que esta reportagem irá tratar pode ser bem resumido nesta idéia.
Por Fernando Galacine
Editor do JE em São Paulo
O que você faz do momento em que acorda até chegar à escola, faculdade ou trabalho? Provavelmente os engraçadinhos de plantão podem responder que abrem os olhos, antes de tudo, mas e depois? Você escova os dentes, toma banho, se veste, pega a bolsa e saí? Não come nada antes? Antes de continuar esta série de perguntas é bom você saber que a maioria dos leitores deste texto _ e por que não, você mesmo_ não diz ou não tem o hábito de tomar um bom café da manhã entre as tarefas do acordar ao sair de casa. E os que dizem não sair em jejum, têm como referência para a afirmação uma simples xícara de café.
Entre os que saem com o estômago roncando e os que tomam o cafezinho no sentido literal da palavra, são poucos os que levam a idéia de comer bem no café da manhã a sério. Apesar de todo mundo saber disso desde criança, os conselhos para evitar passar a manhã de barriga vazia, não tinham um respaldo científico. Não tinham. Uma pesquisa feita pela Universidade do Minessota, nos Estados Unidos e publicada no jornal norte-americano Pediatrics, revelou que adolescentes que consumiam café da manhã tinham um desempenho corporal melhor do que os adolescentes que não se alimentavam pela manhã. Após cinco anos de estudos outra conclusão: os jovens que faziam do bom café da manhã um hábito, engordaram bem menos do que os colegas que não comiam após acordar. O motivo, segundo os especialistas, é bem simples: a fome que poderia ser 'compartilhada' em vários momentos ao longo do dia, é saciada de uma só vez na hora do almoço, e geralmente com alimentos não muito saudáveis. Além disso, quem toma café da manhã tem mais disposição ao longo da manhã, tarde e noite: se você não é sonâmbulo e muito menos ataca a geladeira na madrugada, durante a noite você passa em média de seis a oito horas sem comer nada e isso conseqüentemente faz com que o nível de glicose em seu organismo despenque durante seu sono. Quando acordamos, essa taxa está entre 70mg/dl, quando o normal seria algo em torno dos 100mg/dl. E se você começa a consumir energia sem repor o que já perdeu durante a noite, o nível de glicose começa a cair ainda mais. "Se os níveis de glicose caem para menos de 55 mg/dl, com o jejum muito prolongado, os sintomas podem surgir, como tremores, pessimismo e mal-estar, pois o organismo lança mão dos mecanismos de defesa hormonal para tentar aumentar as taxas de açúcar no sangue" diz a neurologista Maria José Silva Fernandes, professora do departamento de neurologia e neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo, em entrevista à Folha de S. Paulo. Bom, agora você sabe o que pode significar um bom café da manhã? Ok, mas o que é um bom café da manhã? Se de repente você pensou naqueles cafés cenográficos do núcleo granfino da sua novela predileta, esqueça. Café bom, não é necessariamente um banquete, principalmente de pães, massas e folheados. O que custaria uma pequena fortuna e tempo para ser preparado, pode ser muito melhor substituído cultivando-se um hábito que o brasileiro anda perdendo ultimamente: ir à feira.
Afinal, moramos num país tropical, onde existem dezenas de opções de frutas que, dependendo da época, saem muito mais em conta para o seu bolso e para a sua saúde. Banana, mamão e abacaxi são alimentos que além de serem levemente laxantes, combinam muito bem com cereais, como a aveia e também com derivados do leite. Numa refeição como essa você estará consumindo as fibras do mamão e do abacaxi, o cálcio do leite, e as propriedades reguladoras dos cereais, que além de tudo ajudam a 'secar' a gordura que pode existir nas artérias.
Bem antes de você nascer, cientistas no mundo todo já sabiam que cortar entre 30% e 40% de colorias na alimentação dos animais, fazia com que eles vivessem muito mais. Só não sabiam o por que. No entanto, um estudo publicado ano passado na revista científica norte-americana Cell, mostrou que na diminuição de colorias no organismo, duas enzimas que atuam na mitocôndria _ uma central na célula que é responsável pela conversão de alimentos em energia_ tinham seus índices elevados, mantendo mais energia no interior celular e retardando o processo de morte das células. Outro estudo, este feito na Universidade de Wisconsin, também nos Estados Unidos, mostrou que cortando os mesmos 40% de colorias na alimentação de alguns ratos, fez a sobrevida dos roedores aumentar em 38 anos, o que em humanos representaria um acréscimo de 114 anos, aproximadamente. Numa hora dessas você pode estar pensando em voltar para a dieta da sopa, e alguns radicais tentarem a nova dieta da luz... Será que cortar calorias é necessariamente comer menos?
Não tem jeito. Nenhum pedaço de pizza vai ficar enxuto e livre de colorias só porque você quer. Cortar calorias é comer menos. Mas não passar fome. Quando o assunto é longevidade e alimentação, são raros os povos que podem ensinar tanto quanto o japonês. Prova disso é que um dos principais segredos da longevidade nipônica, maior até que uma alimentação baseada em peixes, é comer sem pressa, saboreando cada garfada, ou melhor, cada hashisada de comida. Para entender como alimentar-se com mais calma pode trazer, sim, os benefícios de uma vida mais longa, é necessário explicar o que acontece em seu cérebro no momento em que você está comendo. Entre os vários campos que são ativados antes e durante a refeição, um está diretamente ligado a sua fome _ justamente o que te levou a comer_ e o outro está ligado a saciação dela. Trabalhando em dupla, esses dois campos do cérebro unem informações para 'avisar' quando o que você já comeu está de bom tamanho e induzí-lo a parar de comer. Porém, quando comemos muito rápido, a área responsável pela saciação do apetite não tem tempo suficiente para indicar ao outro campo que o seu organismo não precisa ingerir mais alimentos, o que leva em média 15 minutos após o início da refeição. Enquanto os sinais não chegarem de um campo a outro, por mais que você coma, não ficará satisfeito. No final das contas a fome vai embora, as calorias excedentes e desnecessárias ficam, e você terá uma baita dor estomacal, preço da sua guloseima. Comer devagar é, portanto, a melhor forma para comer menos e viver mais. Mas sem neuroses. "Calorias contam, mas você não precisa contar cada uma delas..." diz o médico Walter Willett, coordenador do Departamento de Nutrição da Escola de Saúde Pública de Harvard, em entrevista à revista Superinteressante. O médico que também é autor de Coma, Beba e Seja Saudável, livro que se tornou referência no assunto entre os norte-americanos, defende a simples idéia de comer sem culpa. Os que descontam a raiva e o estresse do dia-a-dia comendo muito, segundo Willett são os que mais ficam paranóicos à quantidade de calorias em tudo que consomem. O prazer de comer, para elas, quase não existe, o que não é muito diferente dos que acham mais atrativo uma visita a um rodízio do que a um restaurante à la carte. O coma-quanto-puder, não é, nesse caso, sinônimo de prazer e nem de qualidade à mesa. Mudar hábitos sobre como comer, e não necessariamente o que comer, é o essencial para viver mais e melhor.