domingo, 18 de outubro de 2009

Abuso da Fé - Igreja Católica



Por Evelyn Cusnier
evelyn.cusnier@jeinforma.com
do JE em São Paulo



Neste pequeno trecho da obra Revolução Inglesa, de 1960, Hill Cristopher, historiador inglês e professor da Universidade de Oxford na década de 20, nos faz remeter a um passado muito importante para humanidade. A Igreja Católica Romana durante a Idade Média era a principal formadora de opinião. Detentora de todo conhecimento, ela regia as atitudes e condutas das pessoas da época. O JE Informa pesquisou a fundo a história da maior instituição religiosa do mundo. Queremos partilhar com você os resultados desta pesquisa e que cada um, a partir dos fatos expostos decida se o que aconteceu foi ou não um abuso de fé.





A partir destas duas declarações percebemos que a essência da Igreja Católica tem sua doutrina baseada nas recomendações que Cristo deixou aos apóstolos.

Um pouco de história

Com a morte de Jesus os seus seguidores começam a disseminar pelo mundo seus ensinamentos. Até este momento não havia a Igreja Católica. A Igreja era conhecida como primitiva e levava a todos o cristianismo. A palavra cristianismo vem de eklesia, que em grego significa assembleia, entendida como a comunidade dos cristãos que difundem a continuidade da missão de Jesus na Terra.

Sobretudo durante os séculos I e II d.C, os cristãos foram duramente perseguidos, pois seus ideais de igualdade entre todos os homens, pacifismo e humildade se contrapunham aos valores pregados por Roma. Percebe-se que o encalço contra os cristãos tem um caráter muito mais político do que religioso.

Nos três primeiros séculos de nossa Era, os cristãos foram repreendidos sistematicamente. Era uma prática comum no circo romano colocá-los na arena e assistir a suas mortes pelo ataque de leões e tigres. No entanto, o número de adeptos do cristianismo primitivo crescia cada vez mais em todo o império. No século IV, as perseguições deram lugar às conversões. Constantino, imperador que governou de 313 a 337 d.C, assinou o Édito de Milão. A liberdade de culto aos cristãos foi concedida pelo soberano, que pouco antes de morrer se converteu ao cristianismo.

As pessoas poderiam escolher a partir daquele momento qual crença seguiriam, mas o cristianismo ainda não era a religião oficial do império.
O imperador romano Teodósio, para contornar as dificuldades administrativas que o império estava sofrendo , resolveu em 385 dividi-lo em dois: Império Romano do Oriente, cuja capital era Constantinopla, atual Istambul, e Império Romano do Ocidente, com capital em Roma.

A igreja cristã recebeu o nome de Católica no Concilio de Constantinopla, presidido por Teodósio, o primeiro a utilizar o título de Papa, com o decreto "Cunctos Populos”, também conhecido como Édito de Tessalônica, no ano de 391. O Catolicismo tornou-se então, a religião oficial do Império Romano.



A estratégia de divisão do Império Romano não obteve o resultado esperado. Chegava ao fim um dos impérios que mais tiveram poder e autoridade. Nascia o período que conhecemos como Idade Média e a organização social feita por meio de feudos. Porém, alguns feitos do Império Romano prosseguiram durante muito tempo.

O cristianismo primitivo havia sido superado por uma instituição hierárquica que ampliava seu raio de ação. O clero formado pela Igreja Católica fugia ao padrão religioso conhecido. Eram dois os fatores que diferenciavam a nova ordem. O número de cléricos que comandavam a Igreja era maior do que qualquer outra religião conhecida e o prestígio a tornava um grupo distinto dentro da sociedade.

Começou-se a acreditar que o poder do rei era estabelecido pela vontade de Deus e que a religião era a base mais importante desse poder.


Imagem da Biblioteca Nacional da França- Através dessa representação feita no século XV, Jesus (ao centro) entrega ao rei uma espada simbolizando seu poder que tem um tempo de duração. Já o papa recebe uma chave, que simboliza seu poder soberano na Igreja. Portanto, ambos os poderes são atribuições divinas.

Juntamente com o poder político da Igreja, crescia o poder econômico, visto que a doação dos fiéis passaram a constituir o patrimônio da instituição. Durante o século IX, a Igreja era proprietária de um terço das terras cultiváveis da Europa Católica. O celibato clerical fora imposto para garantir que todos os bens dados aos cléricos retornassem à Igreja, uma vez que não haveria herdeiros legítimos para reclamar parte da herança.

Com o fim do Império Romano do Ocidente e o desaparecimento das instituições de Estado que promovia a vida civil e social, a Igreja assumiu um papel público, tornando-se referência. Eram os padres que educavam e informavam as pessoas sobre questões econômicas. Todavia, a força da Igreja e o poder decorrente dessa época levaram parte do clero a se afastar da humildade e da caridade que era pregada pelo cristianismo.

Responsável por difundir a toda uma sociedade valores morais, comportamentais e culturais, a Igreja Medieval tornou o mundo o mais simbólico possível: somente os homens de fé poderiam decifrá-lo. Uma vez que nosso mundo foi criado à semelhança da cidade de Deus, somente quem conhecia o universo celestial podia entender o lugar onde vive.

A Igreja exercia influência sobre a sociedade de diversas formas.



A arte na Idade Média



A literatura oficial era sacra, e tinha por objetivo o louvor a Deus, contava a vida dos santos e reescrevia trechos bíblicos. Os textos filosóficos tentavam compreender os mistérios divinos. E a literatura greco-romana era acessível unicamente aos membros do alto clero, pois ficavam devidamente enclausuradas no mosteiro.

Nas universidades e entre a população o tipo de literatura cultuada era bem diferente. As paródias, imitações cômicas de uma composição literária, eram feitas sobre os textos sagrados, mostrando indignação contra a cultura oficial que era imposta.

As obras de arte possuíam caráter religioso e o teatro foi considerado imoral e violento. Mas os próprios cléricos o trouxeram de volta para encenar cenas bíblicas. Porém, ao ter sido trazida para a rua e espaços públicos, as encenações sofreram mudanças, ao passo que cenas cotidianas, critica às autoridades e satirizações tornaram-se populares. O clero perdia o controle sobre as produções teatrais.


Obra Enunciação de Fra Angélico. Museu Diocesano, Cortona, Itália. 1433.
As produções de arte embora ligadas à religião não perdem seu enorme valor artístico.


As cruzadas

A Igreja divulgava que a participação no que eles denominavam guerra santa, a luta contra os não cristãos [mulçumanos, principalmente], era dever de todo crente. Contudo, as cruzadas foram expedições realizadas pelos cristãos do Ocidente, entre os séculos XI e XIII, que mesclavam aspectos militares, religiosos e econômicos.

Um novo modo de vida, uma reação

Apesar de uma grande parte do clero ser formada por pessoas que realmente tinham vocação sacerdotal e se oponham à prática do nicolaísmo, ou seja a degradação dos costumes; a simonia- prática que consistia na venda do perdão, o comércio de objetos ditos sagrados e os leilões de cargos eclesiásticos indignavam cada vez mais os fiéis.

Em 1231 foi oficializado o Tribunal da Inquisição, instrumento de coerção mais duradouro de que se tem notícia. A ação que durou até o século de XIX alegava combater as heresias.

Heresia é uma palavra grega (haíresis) que significa escolha. Acresce, que todas as ações, palavras ou crenças consideradas ofensivas à Igreja Católica eram punidas severamente.




Cena de Enforcamento e decapitação do Tribunal do Santo Ofício durante o governo do Duque de Alba.



O processo de reformas religiosas teve início no século XVI e podemos destacar como causas dessa reforma abusos cometidos pela Igreja Católica. Uma mudança na visão do mundo foi fruto do novo pensamento, também conhecido como Renascimento.

Este novo modo de ver a vida começou a pairar durante o Fim da Idade Média. Os homens passaram a ter uma visão antropocêntrica. Deus já não era mais a resposta para todas as perguntas que existiam. Essa transição de pensamentos trouxe questionamentos, ocasionando a Reforma Protestante. Entre os protestantes mais conhecidos que indagaram o poder da Igreja, estão Martinho Lutero e João Calvino.

Os principais pontos de convergência indagados eram:

  • a salvação ocorria unicamente pela fé, segundo Efésios 2:8
  • a interpretação da bíblia deveria ser livre
  • deveria existir submissão da Igreja ao Estado
  • a venda de indulgências, perdão pelos pecados dos vivos era uma prática que ia contra os ensinamentos de Jesus.
Os questionamentos fizeram com que através do Concílio de Trento realizado em 1545, a Igreja revisse algumas atitudes do clero que estavam causando insatisfação. Ficando conhecida como Contra-Reforma. As principais decisões tomadas durante o Concílio foram:



Mesmo a Igreja tendo reconhecido algumas atitudes errôneas, o tribunal da Inquisição ficou ainda mais rígido contra aqueles que eram considerados hereges.


Real Academia de Bellas Artes de San Fernando de Madrid- A figura retrata o objetivo dos Julgamentos da Inquisição- aterrorizar os réus e mostrar a força e o poder da instituição.

Somente no século XIX a Igreja foi gradativamente perdendo poder, pois as ideologias pregadas pelo Iluminismo e a Revolução Francesa que difundia a liberdade, igualdade e fraternidade, já não se enquadravam com os preceitos pregados durante os 1200 anos de poder quase que absoluto da Igreja Católica.

Observando a cronologia da história percebemos que a Igreja conseguiu restituir sua imagem e hoje tem sua participação na luta pela paz e nas decisões morais. Respeitada, ela continua a ser uma das instituições mais seguidas do mundo, só que ao contrário do passado esse respeito se deve a credibilidade que reconquistou, e não do medo que um dia impôs à sociedade.


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