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domingo, 18 de outubro de 2009

Abuso da Fé

Primeira Reportagem da Série mostra os desvios da igreja católica em todo o mundo


[A apresentação]

[Leia a primeira reportagem da série]

[Entrevista na íntegra com Padre Juarez]

[Entrevista na íntegra com Elias Feitosa de Amorim Jr.]

Abuso da Fé - Igreja Católica



Por Evelyn Cusnier
evelyn.cusnier@jeinforma.com
do JE em São Paulo



Neste pequeno trecho da obra Revolução Inglesa, de 1960, Hill Cristopher, historiador inglês e professor da Universidade de Oxford na década de 20, nos faz remeter a um passado muito importante para humanidade. A Igreja Católica Romana durante a Idade Média era a principal formadora de opinião. Detentora de todo conhecimento, ela regia as atitudes e condutas das pessoas da época. O JE Informa pesquisou a fundo a história da maior instituição religiosa do mundo. Queremos partilhar com você os resultados desta pesquisa e que cada um, a partir dos fatos expostos decida se o que aconteceu foi ou não um abuso de fé.





A partir destas duas declarações percebemos que a essência da Igreja Católica tem sua doutrina baseada nas recomendações que Cristo deixou aos apóstolos.

Um pouco de história

Com a morte de Jesus os seus seguidores começam a disseminar pelo mundo seus ensinamentos. Até este momento não havia a Igreja Católica. A Igreja era conhecida como primitiva e levava a todos o cristianismo. A palavra cristianismo vem de eklesia, que em grego significa assembleia, entendida como a comunidade dos cristãos que difundem a continuidade da missão de Jesus na Terra.

Sobretudo durante os séculos I e II d.C, os cristãos foram duramente perseguidos, pois seus ideais de igualdade entre todos os homens, pacifismo e humildade se contrapunham aos valores pregados por Roma. Percebe-se que o encalço contra os cristãos tem um caráter muito mais político do que religioso.

Nos três primeiros séculos de nossa Era, os cristãos foram repreendidos sistematicamente. Era uma prática comum no circo romano colocá-los na arena e assistir a suas mortes pelo ataque de leões e tigres. No entanto, o número de adeptos do cristianismo primitivo crescia cada vez mais em todo o império. No século IV, as perseguições deram lugar às conversões. Constantino, imperador que governou de 313 a 337 d.C, assinou o Édito de Milão. A liberdade de culto aos cristãos foi concedida pelo soberano, que pouco antes de morrer se converteu ao cristianismo.

As pessoas poderiam escolher a partir daquele momento qual crença seguiriam, mas o cristianismo ainda não era a religião oficial do império.
O imperador romano Teodósio, para contornar as dificuldades administrativas que o império estava sofrendo , resolveu em 385 dividi-lo em dois: Império Romano do Oriente, cuja capital era Constantinopla, atual Istambul, e Império Romano do Ocidente, com capital em Roma.

A igreja cristã recebeu o nome de Católica no Concilio de Constantinopla, presidido por Teodósio, o primeiro a utilizar o título de Papa, com o decreto "Cunctos Populos”, também conhecido como Édito de Tessalônica, no ano de 391. O Catolicismo tornou-se então, a religião oficial do Império Romano.



A estratégia de divisão do Império Romano não obteve o resultado esperado. Chegava ao fim um dos impérios que mais tiveram poder e autoridade. Nascia o período que conhecemos como Idade Média e a organização social feita por meio de feudos. Porém, alguns feitos do Império Romano prosseguiram durante muito tempo.

O cristianismo primitivo havia sido superado por uma instituição hierárquica que ampliava seu raio de ação. O clero formado pela Igreja Católica fugia ao padrão religioso conhecido. Eram dois os fatores que diferenciavam a nova ordem. O número de cléricos que comandavam a Igreja era maior do que qualquer outra religião conhecida e o prestígio a tornava um grupo distinto dentro da sociedade.

Começou-se a acreditar que o poder do rei era estabelecido pela vontade de Deus e que a religião era a base mais importante desse poder.


Imagem da Biblioteca Nacional da França- Através dessa representação feita no século XV, Jesus (ao centro) entrega ao rei uma espada simbolizando seu poder que tem um tempo de duração. Já o papa recebe uma chave, que simboliza seu poder soberano na Igreja. Portanto, ambos os poderes são atribuições divinas.

Juntamente com o poder político da Igreja, crescia o poder econômico, visto que a doação dos fiéis passaram a constituir o patrimônio da instituição. Durante o século IX, a Igreja era proprietária de um terço das terras cultiváveis da Europa Católica. O celibato clerical fora imposto para garantir que todos os bens dados aos cléricos retornassem à Igreja, uma vez que não haveria herdeiros legítimos para reclamar parte da herança.

Com o fim do Império Romano do Ocidente e o desaparecimento das instituições de Estado que promovia a vida civil e social, a Igreja assumiu um papel público, tornando-se referência. Eram os padres que educavam e informavam as pessoas sobre questões econômicas. Todavia, a força da Igreja e o poder decorrente dessa época levaram parte do clero a se afastar da humildade e da caridade que era pregada pelo cristianismo.

Responsável por difundir a toda uma sociedade valores morais, comportamentais e culturais, a Igreja Medieval tornou o mundo o mais simbólico possível: somente os homens de fé poderiam decifrá-lo. Uma vez que nosso mundo foi criado à semelhança da cidade de Deus, somente quem conhecia o universo celestial podia entender o lugar onde vive.

A Igreja exercia influência sobre a sociedade de diversas formas.



A arte na Idade Média



A literatura oficial era sacra, e tinha por objetivo o louvor a Deus, contava a vida dos santos e reescrevia trechos bíblicos. Os textos filosóficos tentavam compreender os mistérios divinos. E a literatura greco-romana era acessível unicamente aos membros do alto clero, pois ficavam devidamente enclausuradas no mosteiro.

Nas universidades e entre a população o tipo de literatura cultuada era bem diferente. As paródias, imitações cômicas de uma composição literária, eram feitas sobre os textos sagrados, mostrando indignação contra a cultura oficial que era imposta.

As obras de arte possuíam caráter religioso e o teatro foi considerado imoral e violento. Mas os próprios cléricos o trouxeram de volta para encenar cenas bíblicas. Porém, ao ter sido trazida para a rua e espaços públicos, as encenações sofreram mudanças, ao passo que cenas cotidianas, critica às autoridades e satirizações tornaram-se populares. O clero perdia o controle sobre as produções teatrais.


Obra Enunciação de Fra Angélico. Museu Diocesano, Cortona, Itália. 1433.
As produções de arte embora ligadas à religião não perdem seu enorme valor artístico.


As cruzadas

A Igreja divulgava que a participação no que eles denominavam guerra santa, a luta contra os não cristãos [mulçumanos, principalmente], era dever de todo crente. Contudo, as cruzadas foram expedições realizadas pelos cristãos do Ocidente, entre os séculos XI e XIII, que mesclavam aspectos militares, religiosos e econômicos.

Um novo modo de vida, uma reação

Apesar de uma grande parte do clero ser formada por pessoas que realmente tinham vocação sacerdotal e se oponham à prática do nicolaísmo, ou seja a degradação dos costumes; a simonia- prática que consistia na venda do perdão, o comércio de objetos ditos sagrados e os leilões de cargos eclesiásticos indignavam cada vez mais os fiéis.

Em 1231 foi oficializado o Tribunal da Inquisição, instrumento de coerção mais duradouro de que se tem notícia. A ação que durou até o século de XIX alegava combater as heresias.

Heresia é uma palavra grega (haíresis) que significa escolha. Acresce, que todas as ações, palavras ou crenças consideradas ofensivas à Igreja Católica eram punidas severamente.




Cena de Enforcamento e decapitação do Tribunal do Santo Ofício durante o governo do Duque de Alba.



O processo de reformas religiosas teve início no século XVI e podemos destacar como causas dessa reforma abusos cometidos pela Igreja Católica. Uma mudança na visão do mundo foi fruto do novo pensamento, também conhecido como Renascimento.

Este novo modo de ver a vida começou a pairar durante o Fim da Idade Média. Os homens passaram a ter uma visão antropocêntrica. Deus já não era mais a resposta para todas as perguntas que existiam. Essa transição de pensamentos trouxe questionamentos, ocasionando a Reforma Protestante. Entre os protestantes mais conhecidos que indagaram o poder da Igreja, estão Martinho Lutero e João Calvino.

Os principais pontos de convergência indagados eram:

  • a salvação ocorria unicamente pela fé, segundo Efésios 2:8
  • a interpretação da bíblia deveria ser livre
  • deveria existir submissão da Igreja ao Estado
  • a venda de indulgências, perdão pelos pecados dos vivos era uma prática que ia contra os ensinamentos de Jesus.
Os questionamentos fizeram com que através do Concílio de Trento realizado em 1545, a Igreja revisse algumas atitudes do clero que estavam causando insatisfação. Ficando conhecida como Contra-Reforma. As principais decisões tomadas durante o Concílio foram:



Mesmo a Igreja tendo reconhecido algumas atitudes errôneas, o tribunal da Inquisição ficou ainda mais rígido contra aqueles que eram considerados hereges.


Real Academia de Bellas Artes de San Fernando de Madrid- A figura retrata o objetivo dos Julgamentos da Inquisição- aterrorizar os réus e mostrar a força e o poder da instituição.

Somente no século XIX a Igreja foi gradativamente perdendo poder, pois as ideologias pregadas pelo Iluminismo e a Revolução Francesa que difundia a liberdade, igualdade e fraternidade, já não se enquadravam com os preceitos pregados durante os 1200 anos de poder quase que absoluto da Igreja Católica.

Observando a cronologia da história percebemos que a Igreja conseguiu restituir sua imagem e hoje tem sua participação na luta pela paz e nas decisões morais. Respeitada, ela continua a ser uma das instituições mais seguidas do mundo, só que ao contrário do passado esse respeito se deve a credibilidade que reconquistou, e não do medo que um dia impôs à sociedade.


+Conteúdo
[Leia na íntegra a entrevista com Padre Juarez]

[Leia na íntegra a entrevista com Elias Feitosa de Amorim Jr.]

Abuso da Fé - Apresentação da Série



Apresentação da Série

O JE Informa a partir desta semana inaugura sua nova série.  Abusoda Fé foi o nome escolhido. O título pode parecer um pouco ostensivo, mas o que pretendemos é, a partir de rigorosas pesquisas e fontes confiáveis, saber até que ponto as sucessões religiosas que aconteceram no passado, e existem no presente, são um abuso de fé.

Desde o princípio da existência humana o homem vê na fé uma forte aliada para lhe dar sentido à vida, aceitar questões sem respostas e quebrar a monotonia da ordem natural de que tudo nasce, cresce, se reproduz e morre. Fé é a certeza das coisas que se esperam, a convicção dos fatos que não se vêem. Todos precisam acreditar em alguma coisa, pois a dúvida é a raiz da insatisfação. A fé neste contexto consegue sanar nossas questões sobre o desconhecido e amenizar a ansiedade das inquietações que nos afligem.

A fé esteve ligada, em todas as épocas da história, a grandes feitos e conflitos. Ela é responsável pelas explicações as quais a ciência não consegue dar. Apesar de vivermos em um período de tecnologia, onde o capitalismo cria ricos da noite para o dia, miseráveis na mesma velocidade e onde o conhecimento é de fácil acesso, percebe-se que a fé ainda desempenha um importante papel na sociedade. Segundo dados do IBGE apenas 7,4% dos brasileiros assumem não professar uma religião, sendo que dentre estes 1,5% se declaram ateus.

Afirmado o poder da fé sobre a moral e à psique do homem, podemos considerar que ao longo de nossa Era é possível que líderes e autoridades religiosas tenham se aproveitado da fé para se autopromover e manipular pessoas. Escolhemos casos isolados que por muitos foram considerados um “Abuso da fé”. Nem de longe nosso intuito é julgar o que foi ou não um abuso, expomos um conteúdo democrático e damos a você a liberdade de formular uma resposta.


Evelyn Cusnier
do JE em São Paulo

 Fernanda Spigariol
do JE em São Paulo

Entrevista - Padre Juarez de Castro

Entrevista - Padre Juarez de Castro



Mineiro da cidade de Lavras, Juarez de Castro ordenou-se padre em 9 de dezembro de 1995, depois de concluir seus estudos em Santa Catarina e em São Paulo. Trabalhou no Santuário São Judas Tadeu  e depois nomeado como Secretário-Geral do Vicariato da Comunicação na Arquidiocese de São Paulo. Há três anos se dedicando a evangelizar pela canção, seu primeiro CD “Deus está Aqui” foi indicado para o Grammy Latino como melhor álbum de musica cristã. Em entrevista exclusiva ao JE Informa, Padre Juarez de Castro fala sobre a atuação da Igreja no passado e sobre sua vocação.



Por Evelyn Cusnier
evelyn.cusnier@jeinforma.com
do JE em São Paulo


JE Informa- Como senhor descobriu a vocação que tinha e há quantos anos foi ordenado padre?

Pe. Juarez - Pensei em ser padre quando tinha 18 anos. Tive vontade de me dedicar totalmente às pessoas e percebi que o sacerdócio seria o caminho para isso. À semelhança de Jesus que renunciou tudo para ser de todos vou tentando, apesar da minhas limitações, imitá-lo.

JE - O que é necessário para se tornar padre? São quantos anos de estudo no seminário e o que é estudado?

Para ser padre é necessário que o candidato sinta-se chamado - isto é - deve sentir no coração que Deus o chama. São necessários basicamente 10 anos de estudo. Estudos propedêuticos, mais duas faculdades: filosofia e teologia.

JE - Quais os maiores desafios ao se entregar à vida religiosa?

São os desafios que qualquer pessoas enfrenta ao assumir com responsabilidade sua vocação. Ser padre é tão exigente quanto ser pai de família. Em todas as vocações há necessidade de uma resposta diária àquele sim que um dia foi dado. Um sim que deve ser renovado diariamente.

JE - Além das funções básicas que todos conhecem, como rezar a missa por exemplo, quais outras funções que um padre possui e muitos desconhecem?

Além do padre cuidar de uma paróquia, rezando as missas, atendendo confissões, atendendo os doentes nos hospitais, dirigindo colégios, hospitais, obras sociais - muitos padres assumem outros trabalhos missionários. Muitos se dedicam aos meios de comunicação, às artes, músicas. Eu por exemplo, além dos trabalhos normais de um padre, tenho três programas de rádios diários em três rádios diferentes, faço três programas semanais de televisão, cuido do vicariato da comunicação da arquidiocese, e viajo o Brasil fazendo shows de evangelização.

JE - Na sua opinião porque a Igreja Católica é hoje a religião mais seguida no mundo?

A Igreja católica tem dois mil anos de história. Começa com o próprio Jesus Cristo e se desenvolve com uma proposta de libertação, tolerância, amor e solidariedade - tudo o que as pessoas procuram num relacionamento com Deus.

JE - Muitos são contra algumas atitudes tomada pela Igreja durante a Idade Média. Ex: indulgências, inquisição. Como o senhor vê este período? E como a Igreja se posiciona a respeito deste assunto atualmente?

A Igreja cometeu erros porque era dirigida por homens que são falhos. Tais erros existiram num período em que a Igreja não era administrada por somente pessoas ligadas ao clero. A história nos relata que neste período difícil da Igreja duas famílias se alternavam no poder da mesma (Borgia e Medici) essas famílias colocavam seus membros para administrar a Igreja e estes, sem nenhuma formação religiosa ou eclesial, usaram a Igreja para se promoverem e subjugar os outros. Mas felizmente esse período passou. A Igreja pôde expurgar esse tipo de comportamento dentro dela e voltar às origens e ao Evangelho.

JE - Existem pontos positivos da Igreja Medieval que a história não divulga?

Claro. Uma visão tacanha e medíocre sobre a idade média a chama de "idade das trevas". Seria impreciso e até historicamente errado classificar a Idade Média, como idade das trevas. A História e estudiosos sérios já não usam essa terminologia. Pensar que a Idade Média não produziu coisas boas para o mundo seria desconhecer a história. Na Idade Média a arte floresceu, a matemática se desenvolveu levando-nos ao conhecimento das leis da física, a química substituiu a alquimia e a literatura cresceu largamente sendo conservada e produzidas nos grandes mosteiros medievais.

JE - Que recado o senhor deixaria aquelas pessoas que criticam a Igreja por ações do passado?

Não é justo e nem honesto julgar atos passados a partir dos conhecimentos e dados que temos hoje. Isto seria desonestidade histórica. Ninguém realmente honesto usaria desse recurso.

Entrevista - Elias Feitosa de Amorim Jr

Entrevista - Elias Feitosa de Amorim Jr.



Formado pela USP e Coordenador Cultural do Cursinho da Poli, em São Paulo, o historiador Elias Feitosa de Amorim Jr, em entrevista ao JE Informa, conta a história da Igreja Católica Romana.

Por Evelyn Cusnier
evelyn.cusnier@jeinforma.com
do JE em São Paulo


JE Informa- Como e onde surgiu a Igreja Católica Romana?

Elias Feitosa de Amorim Jr - A Igreja Católica Romana tem sua doutrina estruturada a partir dos ensinamentos de Jesus Cristo, os quais se encontram nos Evangelhos e integram junto com outros textos, o Novo Testamento que se somou ao Velho Testamento, este vindo da tradição judaica.

Após a morte de Jesus, por volta do ano 30 da era cristã, seus discípulos (os apóstolos) iniciaram um processo de divulgação da doutrina, seguindo as palavras de Jesus, segundo o Evangelho de Marcos: “Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura.”(Mc 16:15), sendo que aqueles que se converteram começaram a se organizar em pequenas comunidades (eklesia em grego significa assembleia e daí deriva a palavra Igreja), as quais foram perseguidas pelos romanos por mais de trezentos anos e esse momento infeliz gerou inúmeros massacres daqueles que foram se denominando cristãos.

Jesus é a forma latina de Yeshua ben Josef, que em hebraico significa Jesus, filho de José, sendo que Jesus se apresenta como o Messias, palavra que vem do hebraico massiah e significa Salvador. Como os Evangelhos foram escritos em grego, encontraremos a expressão Jesus Cristo, que vem de Christós e significa Salvador nesta língua.

Algumas pessoas acham estranho o fato dos Evangelhos e outros textos do Novo Testamento terem sido escritos em grego e não em hebraico ou aramaico, que eram as línguas faladas entre os habitantes da Judéia naquela época. No entanto, temos que observar a extensão da mensagem, isto é, a língua grega era a língua universal na região do Oriente Próximo em virtude da herança deixada pelo conquistador Alexandre Magno, o qual dominou a região e levou a cultura grega para lá, a qual se manteve mesmo com a dominação romana. Numa visão mais simples, poderíamos dizer que, de certa forma, o grego tinha o mesmo peso que o inglês tem hoje em nossa época, guardado as devidas proporções de cada momento.

Por fim, a origem da expressão Igreja Católica tem seu contexto na palavra grega kathólikos e significa “universal”, isto é, sem limites de fronteiras, domínios ou reinos e está presente onde o fiel estiver presente, proclamando a doutrina de Jesus.

Historicamente, o conceito de universalidade começou a se estruturar no século XI em virtude das disputas entre o poder temporal, representado pelo Sacro Império Germânico que se entendia como herdeiro do extinto Império Romano Ocidental e o poder espiritual representado pelo papa, líder da Igreja Cristã.

Mas, podemos apontar a ruptura entre os cristãos orientais e ocidentais como uma das principais tensões políticas dentro da Igreja Cristã, pois em 1054, os cristãos do oriente romperam com Roma e passaram a seguir o Patriarca de Constantinopla como seu líder, renegando a doutrina romana e a autoridade papal, denominando-se a partir de então Igreja Católica Apostólica Ortodoxa e aqueles que seguiam a doutrina e o papa em Roma ficaram como conhecidos Igreja Católica Apostólica Romana.

JE - No princípio da Igreja quais eram seus dogmas e objetivos?

O objetivo da Igreja Católica Romana é o mesmo até hoje: pregar a doutrina cristã pelo mundo, levando a Salvação a todos os homens. Dogma significa verdade absoluta revelada pelo poder divino e assim é incontestável. Podemos destacar o Dogma da Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo) e o Dogma da Transubstanciação (no momento da Eucaristia, o pão se transforma em carne e o vinho em sangue).

JE - O Imperador Constantino foi o primeiro imperador romano a se converter ao cristianismo, neste caso o cristianismo é o catolicismo?

O imperador Constantino concedeu liberdade de culto aos cristãos e a todos os demais habitantes do império a partir do Édito de Milão em 313 d.C., garantindo assim a livre escolha da fé aos seus súditos, marcando um momento de paz com o fim das perseguições aos cristãos e a consequente proteção destes pelo poder imperial, mas não quer dizer que o cristianismo havia se tornado a religião oficial do Império, fato que ocorreu depois com o imperador Teodósio através do Édito de Tessalônica em 391 d.C.

Voltando ao Constantino, de fato ele foi o primeiro imperador que se converteu ao cristianismo e naquele momento, não se utilizava a denominação catolicismo. A conversão de Constantino é cercada de lendas, dentre elas, a promessa que teria feito ao “deus cristão” que se vencesse seu rival Maxêmio na Batalha de Ponte Mílvia.

O relato diz que ao se direcionar para o conflito, teria visto no céu uma Cruz, acompanhada da inscrição em latim “In hoc signo vinces”, que quer dizer, “Com este sinal vencerás”. Constantino adotou o símbolo visto para o seu exército, venceu a batalha e se converteu, em seguida, foi tomando medidas que amparavam os cristãos como a devolução de bens confiscados.

JE - Em que momento da história a Igreja Romana tornou-se detentora de bens?

Constantino fez doações à Igreja, mandou construir a 1ª basílica de São Pedro que fora substituída pela atual a partir da sua demolição e reconstrução em 1508. Quanto aos territórios, o rei franco Pepino, o Breve (751-771) venceu a tribo pagã dos lombardos e concedeu os territórios dos vencidos à Igreja e nesse contexto teria gerado uma farsa referente aos outros territórios, em virtude da confirmação de um documento chamado “Doação de Constantino”, o qual garantia a posse de terras na Itália e no Ocidente. Somente no século XV, a falsidade do documento foi descoberta por um letrado italiano chamado Lorenzo Valla, mas mesmo assim, as terras não foram devolvidas.

A mudança mais significativa foi com a Unificação italiana em 1871, quando os territórios da Igreja foram conquistados pelas tropas do rei Vitório Emanuel I, que era o rei do Piemonte e Sardenha e tendo derrubado a ocupação austríaca e francesa da península, se tornou o rei da Itália inteira. O papado formalmente não reconheceu esta situação, sendo que o papa Pio IX se considerava um “prisioneiro em Roma”.

Tal situação só foi resolvida com o Tratado de Latrão que criou o Estado do Vaticano em 1929, quando o ditador fascista Benito Mussolini concedeu o controle do antigo bairro cristão do vaticano, lugar onde estava a basílica de São Pedro e outras importantes construções da Igreja para a exclusiva autoridade do papal, o qual se tornaria o Chefe de Estado deste território, uma monarquia teocrática já que seu governante é visto como o “representante de Deus na Terra”.

JE - Qual foi a primeira aliança feita entre a Igreja e o Estado?

A partir do Édito de Tessalônica, houve uma sensível aproximação dos interesses do Império e da Igreja e mesmo com a divisão do império, as invasões bárbaras e a formação de novos reinos na Idade Média, a presença da Igreja Católica Romana junto aos assuntos políticos de diferentes lugares foi intensa. No entanto, fica difícil precisar qual teria sido a “primeira aliança”.

JE - Quando a Igreja começa a se expandir e se tornar uma religião popular?

A popularização do cristianismo vem desde a figura de Jesus e se expandiu ao longo dos séculos, com mais abertura num lugar, menos noutro, aceitação ou perseguição e várias disputas pelo entendimento do que seria a verdadeira fé ensinada por Jesus e daí, as disputas políticas, doutrinárias e as rupturas que conhecemos ao longo da história.

JE - Na sua opinião o fim do Império Romano e a Igreja assumir o papel das instituições públicas foi o motivo para o surgimento de fortes denúncias de corrupções?

A corrupção é uma falha do ser humano, portanto, qualquer instituição organizada pelo homem, independentemente de sua natureza, pode ter indivíduos que sejam corruptores e outros que por sua vez sejam corruptíveis. Ao analisar as denúncias em relação aos crimes cometidos por membros do clero, os fatores são vários e não podem ser tratados de maneira genérica. Todos os erros e abusos de poder não têm justificativas, mas não se pode criar um rótulo que “100% sejam corruptos e descomprometidos”, pois existiram e existem pessoas compromissadas com a doutrina cristã.

JE - Quem foi o primeiro papa?

Segundo a tradição cristã presente nos Evangelhos: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha igreja" (Mt 16:17-19) e assim atribuiu-se a Pedro a condição de 1º bispo de Roma e chefe da Igreja ( Sumo Pontífice) e posteriormente adotou-se o título papa( do latim papam, termo usado pelo imperador Teodósio) , cuja autoridade é respeitada em todo mundo católico romano.

JE - Você acha que a contra-reforma purificou a Igreja?

A Reforma protestante representou uma grande perda de terras, fiéis e impostos para a Igreja Católica, a qual precisou tomar uma série de medidas para a contenção deste processo e de sua recuperação, fenômeno que ficou conhecido como Contra-reforma.

A primeira medida foi a convocação do Concílio de Trento entre 1545 e 1563 com o objetivo de reorganizar a Igreja e estabelecer medidas a serem adotadas naquela situação de “guerra pelos rebanhos”. O concílio reafirmou os dogmas e teve como principais decisões a Reorganização do catecismo para o ensinamento da doutrina católica, a proibição da venda indulgências, a fundação de seminários para a educação e formação dos padres, a criação do Index Librorum prohibitorum [Lista dos livros proibidos] o fortalecimento do Tribunal da Santa Inquisição.

Dentro deste contexto, ocorreu o surgimento da Companhia de Jesus, fundada pelo basco Inácio de Loyola em 1534 , sendo uma organização religiosa de caráter militar com o controle das instituições de ensino na Europa, desempenhando o papel de braço armado da Igreja no Velho e Novo Mundo.

JE - A Idade Média é conhecida por muitos como período das trevas por ter estacionado em algumas áreas, o teocentrismo contribuiu para que não houvesse avanço em algumas partes da ciência?

Foi durante o Renascimento, termo vindo da palavra italiana renascitá, pois acreditava-se que o período anterior, a Idade Média, fora uma " espessa e longa noite gótica" imersa nas trevas e desprovida de cultura. Para os homens do século XV e XVI, a "verdadeira" cultura encontrava-se na Antiguidade, a qual foi banida e em seu lugar a Igreja estabeleceu o teocentrismo. O saber, portanto, encontrava-se nas artes e nos escritos clássicos.

A Igreja Católica deteve o monopólio cultural na Idade Média, tornando-se a guardiã do conhecimento no intuito de preservar seus interesses e garantir sua posição como incontestável. Dessa forma, incentivou a produção cultural que favorecesse seus objetivos, principalmente a reafirmação de seus dogmas e a supremacia do papado.

Um dos principais centros de cultura durante a Alta Idade Média foram os mosteiros e abadias, como os mosteiros de Cluny e Císter, os quais influenciaram muitos outros .Nestes locais realizavam-se estudos sobre a Bíblia, cópia de textos em pergaminhos e livros como também sua decoração com iluminuras. Outro importante trabalho dos monges eram as traduções de textos dos pensadores da Antigüidade, como Aristóteles, Platão, Sócrates, entre outros.

Durante os séculos XVIII e XIX, a imagem da “Idade das Trevas” foi fortalecida e prevaleceu até últimos 30 anos, quando medievalistas de vários países começaram a apresentar um conhecimento menos estigmatizado sobre o período medieval e principalmente, mostrar que houve muita cultura e desenvolvimento, os quais são utilizados até hoje, como por exemplo, as Universidades.

JE - Como eram usadas as indulgências e para que serviam?

As indulgências consistiam na venda de perdão dos pecados, tanto daqueles que estavam vivos como daqueles que estavam mortos e as almas destes “poderiam assim deixar o Purgatório e rumar para o Paraíso”. O objetivo de sua venda era arrecadar recursos para a igreja, como por exemplo, a construção da Basílica de são Pedro a partir de 1508, mas não temos como provar o real direcionamento destes recursos, que podem muitas vezes, terem sidos desviados para outros fins.

JE - Como a Igreja conseguiu restituir a imagem agressiva que deixou no passado voltando a ter credibilidade?

Desde o século XVIII com a Revolução Francesa e sua influência, o sentimento anti-clerical se espalhou por várias partes da Europa, enfraquecendo o poder da Igreja gradativamente. No século XIX, a perda de poder chegou aos países tradicionalmente católicos como Portugal, Espanha e Itália e ao mesmo tempo com as independências das colônias na América, houve também uma gradativa redução do poder que outrora a instituição teve.

Pode-se dizer que depois da II Guerra Mundial (1939-45), o papado procurou assumir uma postura muito mais interessada nos valores cristãos, condenando os abusos e desmandos, mas nem sempre foi uma atitude homogênea, pois o papa Pio XII(1939-59) ainda foi e é muito criticado pelo seu silêncio em relação às atrocidades nazistas. No entanto, outros dirigentes como João XXIII(1959-63), Paulo VI(1963-79) e João Paulo II(1979-2005) procuraram impor em seu discurso uma intensa defesa da cristandade e dos valores humanitários e reduziram em muito a postura intolerante do clero católico quanto às outras crenças, abrindo caminho para uma aproximação com diferentes religiões.

JE - Como você vê a atuação da Igreja no passado, as cruzadas, a inquisição, o index-lista de livros proibidos e pagamentos de indulgências. Existem pontos positivos da Igreja Ancestral que muitos desconhecem?

É inegável que a Igreja Católica cometeu erros, muitos de grande gravidade, porém os erros do passado não podem ser a única e exclusiva referência que devemos ter da instituição. A História serve justamente para tomarmos o conhecimento de tais eventos, dentro de um determinado processo histórico e naquele contexto, buscar a sua compreensão e nem por isso vamos deixar de lado e falar que “mas isso foi no passado e não vamos mais falar no assunto”.

A Igreja Católica Romana foi responsável por uma imensa contribuição artística, basta observarmos seus templos, museus e bibliotecas, bem como a cultura produzida em diferentes campos como a filosofia, pedagogia, música, matemática, entre outras áreas do saber.

A instituição “Igreja Católica Romana” pode ter cometido muitos erros no passado, mas apesar disso, centenas de pessoas ao longo dos séculos, dedicaram sua vida em ajudar o próximo, dentro do exemplo deixado por Jesus, fazendo que pobres tivessem assistência, doentes tivessem cuidado e que o bem fosse preservado, mesmo que representasse entregar a própria vida e não foram poucos que o fizeram.